quarta-feira, 29 de dezembro de 2010

E a bola não entrava...



Taguatinga (lembro até dos cheiros) - Aí vai uma crônica sobre o dia em que vi as três cores que traduzem tradição dominarem o Brasil.

O dia 05 de dezembro de 2010, assim como alguns outros deste ano, ficará guardado na minha memória por bastante tempo. Era um domingo. Raramente faço planos para os domingos. Gosto de dedicar este dia à família. Às vezes, vou à feira com a Cris, levo os gêmeos para passear ou visito algum familiar. Mas raramente faço planos. Outra rotina comum aos meus domingos é assistir aos jogos do Flu. Tanto é assim, que a Cris já se habituou a desenhar os "itinerários" em função do horário do jogo do Flu. Quando o Flu joga no sábado, fica mais fácil, obviamente. Futebol para mim é o Flu, mas de vez em quando assisto a qualquer jogo que esteja passando na televisão, e quando falo qualquer jogo, é qualquer jogo mesmo, tipo Blackburn X Aston Vila pela Premier League. Neste dia, meu único plano era ver o jogo final do Flu no Campeonato Brasileiro 2010, jogo que poderia nos valer o título.

Acordei cedo. E já acordei tenso. Os gêmeos, já devidamente "pilhados"por mim no dia anterior, me pediram para vestir o uniforme do Flu, o que fiz com todo prazer. Nos dias comuns, o tempo voa quando estou com os gêmeos, mas neste dia, não. O tempo não passava. E a tensão crescia. Havia combinado de ver o jogo no Restaurante Bom Tempero, tradicional reduto Tricolor. Já perdi a conta de quantos jogos assisti lá. Um deles, foi a final da Copa do Brasil em 2007, quando o Flu ganhou do Figueirense por 1 x 0. Combinei com o pessoal que estaria no local às 15hrs para evitar imprevistos e assegurar um lugar legal. Mas a hora não passava. Inventei diversas atividades com os pequenos,  almoçamos, coloquei-os para dormir e ajudei a Cris a arruma-los para um passeio enquanto eu assistia o jogo. Então, sem que eu percebesse, a hora passou. E já eram 15hrs. Tomei um banho "à jato", troquei de camisa do Flu (já vestia roupas do Flu desde a sexta-feira) e fui.


Cheguei ao Bom Tempero por volta de 15h40m. O local já estava cheio, mas não lotado. Ao estacionar o carro, tive a grata surpresa de encontrar o Tio Pedro e o Rafael, que também acabavam de chegar. Eu, o Tio Pedro e o Rafael formamos o trio mais fanático da nossa família. Tínhamos que ver o jogo juntos. No restaurante não havia mais mesas disponíveis, então nos separamos em busca de algum lugar para "encostar". O Tio Pedro encontrou uns conhecidos que, gentilmente, nos convidaram para ficar em sua mesa, que ficava exatamente em frente a uma das televisões do bar. Ainda faltava mais de uma hora para o início do jogo e já estávamos no clima: camisas, bonés, bandeira, gritos de guerra, músicas e etc. Daí o relógio resolveu parar novamente. E não dava 17hrs.

Ao chegar no Bom Tempero, a tensão aliviou um pouco, mas não foi embora. Já havíamos vivido diversas finais, principalmente nos últimos anos, mas não tinha jeito: eu sempre ficava tenso. O sol estava muito forte, normal para uma tarde de verão, então, fomos forçados a tomar uma cervejinha, enquanto esperávamos pelo grande momento. Tomando uma cerveja, conversando e relembrando outras finais, fizemos o relógio trabalhar a nosso favor e o jogo, finalmente, ia começar. A primeira expectativa: Sheik jogaria ou não? Jogaria. Ótimo, já que os reservas não eram constantes, então comemoramos. Os times alinharam-se e o jogo começou. E eu não estava mais tão tenso. Passaram-se um, dois, três minutos e a bola não entrava. O Flu dependia apenas de si. Era ganhar o jogo e pronto. Não era preciso olhar para trás ou para os lados. Mas a danada da bola não entrava. No primeiro tempo, eu não estava querendo ficar ligado no que acontecia nos outros jogos, até que recebemos a notícia de que o goiás havia feito o primeiro gol em cima do corinthians, nosso principal oponente. O guarani, nosso adversário, no dia, estava jogando solto (apesar do time ser limitadíssimo) e o Flu estava nervoso demais. E a bola não entrava. Chance de gol do bugre, chance de gol do Flu, e a bola não entrava. Mais ou menos aos 30min do primeiro, nova bolinha na Globo. Empate do corinthians. Apreensão Tricolor. Clima tenso. E a bola não entrava. A sensação de todos era que o time estava absorvendo toda a tensão da torcida, acumulada por 26 anos. Torcida esta que foi motivo de chacota por parte da imprensa e da torcida dos outros times, culpa de três rebaixamentos consecutivos e de algumas bravatas realizadas por dirigentes irresponsáveis. Toda a tensão e angústia vivida pela torcida mais apaixonada do Brasil estava sendo transmitida para o time em campo. Era nítido. E a bola não entrava. Assim acabou o primeiro tempo.


Para muitos, a hora do intervalo é a hora de relaxar, tomar um fôlego e tudo mais. Para todos os Tricolores do Brasil, estes quinze minutos (para mim foi muito mais) não foram bem assim. Vimos os gols do jogo do corinthians, junto com gols de outros jogos e seus melhores momentos. A rede Globo mostrou a classificação atualizada e, à permanecer aqueles resultados, seríamos campeões. Aliás, em nenhum momento da rodada o Flu fora ultrapassado por seus concorrentes diretos. E o segundo tempo começou. E a bola não entrava. O time parecia um pouco mais determinado, apesar de ainda apresentar certo nervosismo. Aos 5min do segundo tempo (aproximadamente), bolinha na tela da Globo e todos segurando a respiração. Daí o Rafael, que acompanhava o jogo pelo rádio grita: "Gol do palmeiras". Ufa! Nosso segundo concorrente, o cruzeiro, estava perdendo. Tudo sob controle. E a bola não entrava. Muricy resolveu mexer no time. Colocou Washington, o Coração Valente em campo. O cara vinha de 14 jogos (salvo engano) de jejum. E em sua segunda jogada, Washington aprofunda na esquerda para Carlinhos (nesta hora, o Rafael fala pra mim, com os olhos vidrados "foi gol") que cruza na medida para Emerson (o Sheik) completar para o gol. A bola entrou. Não, o Rafael não é um vidente, um adivinho ou algo que o valha. É um mané que fica escutando o jogo pela rádio e leva a vantagem de alguns segundos de antecedência em relação à televisão. Ver a rede balançar após a escorada do Sheik foi um verdadeiro êxtase. Toda a tensão acumulada foi extravasada. A torcida se abraçava, alguns choravam e outros rezavam. Aquele era o gol que esperávamos por 26 anos. O gol que nos traria a redenção no cenário nacional, que nos deixaria sorrindo orgulhosos até o ano de 2011. Gol marcado por Sheik, logo ele, que chegou sob desconfiança por parte da torcida, por conta de seu passado flavelado rubronegro. A redenção do Flu também era a sua. Mas ainda estávamos aos 17min do segundo tempo. Havia trinta minutos de jogo pela frente e haja tensão. Então o tal relógio resolveu jogar contra, novamente. E não tinha quem o fizesse andar. Mas um clube que tem em seu hino a frase "quem espera sempre alcança" sebe como derrotar o relógio também. E foram trinta minutos muito tensos. Dos mais tensos que já vivi. Alguns esperavam que acontecesse alguma tragédia, pois os títulos do Flu, via de regra, vem acompanhados de uma considerável dose de sofrimento. Para nossa alegria, nenhuma reviravolta aconteceu. O jogo acabou e fomos campeões. Na verdade, o somos até agora. O somos desde que a bola entrou...

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